sexta-feira, 27 de junho de 2014
SOBRE A NOÇÃO DE 'FRONTEIRA'
Na História da América do norte, o vocábulo ‘Fronteira’ nunca quis dizer aquilo que o termo significa na Europa; onde essa palavra designa a raia, os limites entre dois estados soberanos. Nessas circunstâncias, os americanos usam a palavra ‘border’. A ‘Fronteira’, tantas vezes evocada nos filmes de pioneiros era, do outro lado do Atlântico norte, uma linha civilizacional, que separava as terras já conquistadas e desbravadas pelos colonos de origem europeia e os territórios ainda sob o domínio das diferentes nações ameríndias. Daí ser móvel, mudar constantemente de lugar, à medida que avançavam os carroções dos emigrantes e que se implantação fortes militares com guarnições que protegiam os pioneiros e que negavam aos povos autóctones (pela força das armas) toda veleidade de manterem a integridade das suas terras ancestrais. O objectivo supremo dos brancos era alcançar o chamado Oeste selvagem. Terra quase mítica, que, no século XVIII, em vésperas da independência dos Estados Unidos da América e pouco depois desse acontecimento histórico e decisivo, se situava a escassas milhas das paliçadas das cidades de Nova Iorque ou de Albany; como o ilustram, entre outros, os filmes «OUVEM-SE TAMBORES AO LONGE» («Drums Along the Mohawk», de John Ford, 1939) ou «O PRIMEIRO REBELDE» («Alleghany Uprising», de William A. Seiter, 1939). Depois disso, a progressão para poente fez-se lentamente, progressivamente. Mas de maneira inexorável, empurrando os povos autóctones para fora dos seus territórios e obrigando-os a guerrear outras nações indígenas que, também elas, se sentiam invadidas por intrusos, embora da mesma raça. Facto esse, que dividia e confundia os povos pele-vermelhas e favorizava os intentos dos europeus; que, já no século XIX, desembarcavam em vagas maciças e sucessivas nos portos da costa atlântica. De onde eram escorraçados para as terras livres do Oeste pelos ‘pais peregrinos’ e quejandos, que os haviam precedido, nos séculos XVII e XVIII e que já ali formavam uma espécie de aristocracia pouco (ou nada) dada a dividir privilégios. Nessas circunstâncias, às ondas de recém-chegados da Europa (de onde muitos milhares deles fugiam das fomes cíclicas, da intolerância religiosa e política e da impossibilidade de possuir o seu próprio quinhão de terra) só restava cumprir aquilo a que um presidente da União chamaria o ‘destino manifesto’ dos Estados Unidos, que era marchar e marchar para Oeste, até que os territórios situados entre o Atlântico e o Pacífico formassem um só e único país. Quando em 1861 rebentou a guerra civil, a pressão sobre as nações indígenas já se fazia sentir muito para lá da linha Mississippi-Missouri, que, durante muito tempo, fora vista como a divisória entre o Leste civilizado e o Oeste selvagem. Esse conflito entre estados veio interromper uma conquista que já toda a gente dava razoavelmente como adquirida. Restava apenas submeter algumas nações mais aguerridas, como os Sioux e os Cheyennes (entre outras) concentradas na região das Black Hills e os Apaches, que, irredutivelmente, continuavam a resistir nos desertos do Arizona e do Novo México. O que fez temer ao tenente John Dumbar, personagem nuclear do filme «DANÇAS COM LOBOS» («Dances with Wolves», de Kevin Costner, 1990), já no período final da também chamada guerra de Secessão, que a ‘Fronteira’ desaparecesse, antes que lhe fosse dada a possibilidade de ‘vê-la’ e de vivê-la. A conquista definitiva dos territórios ameríndios terminou nas derradeiras décadas do século XIX, com o hediondo assassínio de líderes como Crazy Horse e Sitting Bull (dos Sioux) e com a rendição de Gerónimo, o último resistente Apache. E, naturalmente, com o internamento -em imundas reservas- dos povos genuinamente americanos. No que respeita a ‘Fronteira’, refira-se que já só é evocada esporadicamente nos raros westerns ainda produzidos por Hollywood…
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário